Você, seu eu e sua criação
(um exercício de escrita criativa, e de vida)

A palavra “conexão”, hoje, está muito relacionada à tecnologia. Estamos conectados à internet, e é dessa forma que vemos nossos filmes, compramos nossos livros, fazemos nossas transações bancárias, trabalhamos, namoramos, acompanhamos a vida dos nossos amigos e das celebridades nos stories, sentimos cada vez mais raiva da política com as notícias no nosso feed, fazemos nossas reuniões de trabalho etc.
E nossa dependência dos fios de fibra ótica, banda larga e sabe-se lá mais o que é tão grande, que quando nos aparece na tela “problemas de conexão”, a barriga gela.
Já nas situações em que as redes sociais saem do ar, por minutos, aí o desespero é muito maior: lágrimas de sangue escorrem, o suor fica frio, o mundo acaba por alguns instantes e grandes prejuízos, para alguns, acontecem.
Dia após dia, estamos cada vez mais conectados, ao menos virtualmente falando. A internet parece romper com a ideia de tempo e espaço que temos. Hoje podemos estar em vários lugares ao mesmo tempo, a conexão coloca à prova as leis da Física.
Mas conexão, a palavra, não está relacionada apenas à transferência de dados, ou comunicação entre dois pontos por meio de vídeo e som. Conexão, e é o Michaelis que diz, também significa aquilo que conecta, une, liga (nada melhor que um dicionário para nos lembrar de significados que às vezes andam meio perdidos ou esquecidos). E para unir não são precisos cabos e redes.
Nos conectamos com a natureza quando caminhamos na praia, sentindo as ondas que alcançam nossos pés, vendo as nossas pegadas sendo apagadas pelo mar na areia, ouvindo o som das águas, sentindo o vento, pelo tato e pela audição numa tarde de verão de temperatura agradável.
Nos conectamos com nosso cachorro quando passamos a mão nos seus pelos e o vemos abanando o rabo e movimentando as orelhas, demonstrando como é bom ser amado.
Nos conectamos com o outro quando tocamos a pele da pessoa amada e sentimos aquele arrepio que parece que é amor; ao ouvirmos a sonora e indiscreta risada de um amigo; quando a filhinha, com um léxico ainda limitado apenas composto de primeiras palavras diz “ te amo, papai”; à mesa, partindo o pão e tomando café com a família.
Não é preciso um dispositivo eletrônico para a conexão, esta pode se dar ao vivo e a cores, com cheiros, toques e sabores, no tête à tête.
E há também uma outra conexão, da qual eu costumo falar bastante para meus alunos nas aulas de escrita criativa: a conexão da gente com a gente mesmo.
Você costuma fazer isso?
Consegue ficar a sós com você mesmo?
A sós de verdade: você e você. Você, e só você, conversando com você, te ouvindo, se sentindo. Ninguém mais, só você, sem outras pessoas, sem cabos, sem Wi-Fi. Você e seu eu.
Essa autoconexão é muito importante para o nosso processo criativo. Por meio dela, olhamos lá para dentro de nós mesmos, e com isso podemos recuperar perdidos e fazer uns achados.
Cursos, trocas, leituras são importantes para estimular a nossa criatividade, mas esse tempo sozinho, se conectando, é essencial para o nosso trabalho com a escrita.
A forma de se conectar é ampla e relativa. Algumas coisas fazem sentido para uma pessoa e não fazem para outra, então escolha as que façam sentido para você.
Gosta de meditar? Medite.
Prefere correr? Corra. O Haruki Murakami tem um livro chamado “Do que eu falo quando eu falo de corrida”, em que ele conta a importância da corrida para processo criativo dele.
Tem alguma receita maravilhosa que você tem vontade de fazer, mas nunca fez? Faça essa semana (dica: aqui no blog tem uma crônica-receita de um delicioso bolo de fubá com goiabada. Se fizer, me conta).
E aquele filme que você está para assistir, mas nunca assiste? Sim, esse mesmo. Boa sessão de cinema aí.
Saia para dar uma volta sozinho, conhecer um ponto interessante da cidade, como aquele café que abriu esses dias, ou um museu, uma loja. Se você mora na praia nem preciso falar onde você deve ir caminhar.
Procure fazer algo manualmente, que exija a sua atenção. Lembro que nas Olimpíadas desse ano, o Tom Daley aparecia tricotando, literalmente, na arquibancada. Tricô, crochê, atividades que exigem atenção e concentração geram silêncio e conexão.
Eu não sou do tricô, mas esses dias precisei pregar um botão em uma camisa, coisa nunca feita dantes por mim. Depois de uma consultoria de minha mãe, fui com minhas mãos à obra. O duelo para colocar a linha na agulha, o cuidado para pregar bem, bonito e não furar o dedo – deu tudo certo! – exigiram muita concentração. Pode não parecer, mas ações como essas têm a capacidade de nutrir a nossa criatividade.
Organizar a casa pode gerar insights para a escrita. Que tal escrever sobre aquele objeto perdido que você achou no armário? Qual a sua história com ele?
Permita-se estar como você. Essa boa solidão colabora com o autoconhecimento, proporciona insights e alimenta a nossa criatividade.
Conecte-se!
Tenha um ótimo encontro com você mesmo!
18/10/2021
Eduardo Barbosa
Amei o “podemos recuperar perdidos e fazer uns achados” parabéns pelo texto!
E vamos de conexão!
❤️ Siléa
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Conectar-se, recuperar e achar. Obrigado pela leitura. 🙂 🙂
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